sexta-feira, 3 de dezembro de 2021

Jazz, uma jornada sem fim

Não é de hoje que recebo e-mails de internautas perguntando como nasceu o meu interesse pelo jazz, a ponto de lançar um livro de 700 páginas sobre o assunto. É claro que isso não aconteceu da noite para o dia, mas nada foi pensado ou programado para acontecer.

No início da década de 1990, fui trabalhar em uma loja de CDs na capital paulista chamada Mr. Music, que ficava no bairro dos Jardins. Foi ali que a primeira "semente" foi plantada. No decorrer de toda a década de 1990, convivi com os discos em diferentes lojas, além da Mr. Music. Também passei pela Planet Music, Trax Musical Mind, Hi-Fi e Musical Box.
Guia de Jazz SobreSites virou o livro Jazz ao seu alcance

Por todas essas lojas, tive a oportunidade e a sorte de encontrar um rico acervo de discos importados, entre eles, o jazz. Mas com 20 e poucos anos de idade, o jazz não era algo que realmente me atraia. Mesmo assim, fui me familiarizando com os principais nomes e fazendo uma seleção natural a cada audição, sem qualquer ajuda "didática".

Os anos foram passando e o meu interesse por jazz não cresceu muito. Mas a vida dá voltas, não é mesmo? Com a chegada do novo milênio, as lojas de CDs já não tinham a mesma relevância entre os consumidores de música. A pirataria e a febre do mp3 deixaram claro que os dias de glória das vendas de discos ficariam para trás. E assim aconteceu. Uma a uma, as lojas foram quebrando e o meu ganha pão, também.
Na década de 1990, a loja Planet Music foi uma das mais importantes de SP

Então, fui obrigado a procurar outro tipo de trabalho. Para minha sorte, ou não, sou formado em jornalismo, mas até aquela época não tinha trabalhado na área. E assim continuou. Por um longo período, fiquei sem emprego e ocioso. E foi nesta entressafra que "caiu na minha mão", uma pequena nota do caderno de informática do jornal Folha de S. Paulo. Ela falava sobre um portal chamado SobreSites, que basicamente trazia guias dos mais diversos assuntos, apontando sites para os internautas visitarem.

Todos os guias eram geridos por editores volutários e qualquer pessoa poderia participar, desde que o assunto escolhido fosse aprovado pelos criadores do site. E assim aconteceu. Não sei exatamente o motivo, mas eu me animei e resolvi desenvolver um guia sobre jazz, apontando sites de músicos, rádios, revistas, gravadoras, lojas de discos, entre outras.
Loja Mr. Music e seus vendedores: Júnior, Emerson e Paulo

Pronto, dai em diante, nunca mais parei. A foto que abre esse post é a capa deste guia de jazz que mantive entre 2001 e 2015. Ele foi descontinuado pelos administradores do site. Mas, até aí, o "estrago" já estava feito. O grande conteúdo do guia virou o livro Jazz ao Seu Alcance, lançado em dezembro de 2009 pela editora Multifoco.

Com o fim do guia de jazz, criei o blog que você está visitando, sempre com o objetivo de aproximar o jazz cada vez mais das pessoas. E é isso que continuo fazendo. Divido um pouco do que sei e apresento este universo tão amplo e ainda desconhecido para muitos, ainda mais no Brasil. Apesar de todos os desafios que acontecem há duas décadas, a dedicação e a alegria de poder dividir e aprender continuam as mesmas. Que continue assim.

quarta-feira, 1 de dezembro de 2021

Trio de Bill Charlap volta ainda mais preciso e afinado


A tradição do trio em sua composição mais clássica (piano, baixo e bateria) é uma das principais portas de entrada para ouvir o jazz. Como não ficar seduzido pelo piano de Bill Evans, Oscar Peterson, Gene Harris, Chick Corea, Mulgrew Miller, Esbjörn Svensson, Keith Jarret e Brad Mehldau?

Infelizmente, com as mortes de Corea e Svensson e a aposentadoria forçada de Jarrett, a magia desta formação perdeu um pouco do seu brilho e da sua influência. Hoje em dia, Mehldau é um dos poucos "sobreviventes" à frente de um trio com uma história de mais de duas décadas para contar.

Vale mencionar também o pianista cubano Gonzalo Rubalcaba. Apesar de não manter um trio sempre com os mesmos músicos, ele tem costume de gravar com essa formação. Em 2021, ele lançou o disco Skyline, indicado ao Grammy na categoria melhor disco de jazz, ao lado dos veteranos Ron Carter (baixo) e Jack DeJohnette (bateria).

Mas Meldau não está sozinho. Outro representante desta escola de jazz, também com um trio em atividade há muitos anos, é o pianista Bill Charlap, que em 2016 conquistou o Grammy em parceria com o cantor Tony Bennett. Agora, depois de uma década longe da gravadora Blue Note, ele retorna com o belíssimo álbum Streets of Dreams, novamente acompanhado pelo baterista Kenny Washington e baixista Peter Washington.

No repertório, Charlap não fez escolhas óbvias e, com isso, deixou o disco mais ousado e livre para a química existente entre os três músicos. De saída, "The Duke", composição de Dave Brubeck em homenagem a Duke Ellington. Em seguida, a sempre inspirada parceria de Billy Strayhorn e Ellington, aparece aqui na bela "Day Dream", com Kenny abusando da vassourinha. Com a mesma pegada aparece "Your Host", com o piano cadenciado de Charlap em pura sintonia com baixo e bateria.
Kenny Washington, Bill Charlap e Peter Washington tocam juntos há duas décadas


O trio pega fogo em "You're All the World to Me", tema que ficou famoso na voz de Fred Astaire, e em "Out of Nowhere", da década de 1930 e gravada, entre outros, pelo cantor Bing Crosby. Outro tema que merece destaque é a composição de Michel Legrand "What Are You Doing the Rest of Your Life", uma balada para machucar o coração, assim como "I'll Know", de Frank Loesser.

Com o novo álbum, Charlap volta a ser protagonista e mostrar que é possível fazer jazz de gente grande sem precisar suar na frente do piano ou escalar naipes de metal para soar "mais jazz". Seu piano preciso e a sinergia com Kenny e Peter são frutos da linguagem universal que apenas a música, em especial o jazz, podem prover.










quarta-feira, 24 de novembro de 2021

Jon Batiste e Tony Bennett lideram corrida pelo Grammy


Os indicados para a edição número 64 dos prêmios Grammy foram divulgados no dia 23 de novembro.

Ao todo, são 88 categorias dos mais diversos gêneros musicais. Na última década, a importância da premiação tem sido questionada por quase todos os envolvidos, entre eles, os artistas, a crítica e o público.

Apesar da mudança na indústria fonográfica e a gritante diferença na maneira do público consumir música, as premiações continuam sendo uma vitrine importante para os artistas, em especial o Grammy, notoriamente a mais importante do gênero, mas com muito menos impacto nas carreiras de seus vencedores e indicados.

Como sempre acontece, o Grammy privilegia os artistas da música pop nas indicações principais e na festa de premiação, que nesta edição acontecerá em 3 de abril. Neste ano, as estrelas pop em destaque são Justin Bieber, Billie Eilish, Lil Nas X, Olivia Rodrigo e H.E.R. Mas há dois forasteiro entre os mais indicados: Jon Batiste e Tony Bennett, acompanhado de Lady Gaga.

Pianista, compositor, cantor e arranjador, Batiste foi indicado em 11 categorias, quase todas pelo disco We Are (foto), lançado pela gravadora Verve. As principais categorias são Gravação, Música e Disco do Ano. Ele também concorre pela trilha do filme Soul, animação da Pixar, que tem o personagem principal inspirado no cantor. Batiste ganhou o Globo de Ouro e o Oscar com essa trilha.

Quem também chegou com força ao Grammy é o disco Love for Sale, dos cantores Tony Bennett e Lady Gaga. Essa é a segunda parceria da dupla, que lançou em 2014 a primeira colaboração juntos.

Desta vez, o repertório traz apenas composições do genial Cole Porter, um dos compositores mais regravados entre os jazzistas. O disco recebeu seis indicações, incluindo Gravação, pela música "I Get A Kick Out Of You", e Disco do Ano.

BRAZUCAS NA DISPUTA


O Brasil está concorrendo em quatro categorias, uma com a pianista Eliane Elias, e três com Sergio e Clarice Assad e o Third Coast Percussion. Eliane concorre como melhor disco de jazz latino pelo álbum Mirror Mirror, no qual faz duetos com os pianistas Chick Corea e Chucho Valdés. Corea morreu em fevereiro de 2021, na véspera do Grammy 2021.

O violonista brasileiro Sergio Assad e a filha Clarice (voz e piano) concorrem pelo disco Archetypes, uma parceria com o Third Coast Percussion, grupo de percussão do estado americano de Illinois. As categorias são: Composição Clássica Contemporânea, Engenharia de Álbum Clássico e Performance de Música de Câmara. Sérgio também é conhecido por seu trabalho no Duo Assad, ao lado do irmão Odair, com quem divide os violões e uma carreira internacional de sucesso há três décadas.

CATEGORIAS DE JAZZ


Por falar em Chick Corea, ele concorre em outras três categorias. O disco Plays, com composições clássicas e de jazz, é um dos indicados em Clássico Compêndio. As outras duas são pelo álbum Akoustic Band LIVE, ao lado de John Patitucci e Dave Weckl. Na mesma categoria de disco de jazz, estão na briga o guitarrista Pat Metheny (Side-Eye NYC), o baixista Ron Carter (Skyline), o cantor Jon Batiste (Jazz Selections: Music From And Inspired By Soul) e o trompetista Terence Blanchard (Absence).
Chick Corea, John Patitucci e Dave Weckl concorrem com álbum duplo ao vivo


Blanchard também disputa na categoria Gravação de Jazz, com o tema "Absence". Ele concorre contra o trompetista Christian Scott aTunde Adjuah (Sackodougou), o pianista Kenny Barron (Kick Those Feet), o cantor Jon Batiste (Bigger Than Us) e o pianista Chick Corea (Humpty Dumpty (Set 2)).

Na categoria Disco Cantado, concorrem o atual vencedor, Kurt Elling (SuperBlue), em parceria com o guitarrista Charlie Hunter, a dupla The Baylor Project (Generations), e as cantoras Nnenna Freelon (Time Traveler), Gretchen Parlato (Flor) e Esperanza Spalding (Songwrights Apothecary Lab). O disco de Gretchen tem duas canções interpretadas em português, além das participações dos músicos brasileiros Airo Moreira (percussão), Marcel Camargo (guitarra) e Léo Costa (bateria)

A cantora Jazzmeia Horn volta a disputar um Grammy, mas desta vez na categoria Disco de Orquestra, com o aclamado Dear Love, seu terceiro álbum e sua terceira indicação. Ela terá no páreo os discos de The Count Basie Orchestra (Live At Birdland!), Christian McBride Big Band (For Jimmy, Wes And Oliver), Sun Ra Arkestra (Swirling) e Yellowjackets + WDR Big Band (Jackets XL).

JAZZ, MAS SEM SER JAZZ


Os músicos de jazz também conquistam indicações em outras categorias que não são propriamente de jazz. Neste ano, por exemplo, a cantora Norah Jones concorre com o seu disco Til We Meet Again na categoria Disco Tradicional Pop Cantado. O disco de Bennett e Lady Gaga também está disputando nessa categoria.

Na categoria Álbum Contemporâneo Instrumental, todos os cinco indicados são músicos de jazz. São eles: Randy Brecker & Eric Marienthal (Double Dealin'), Rachel Eckroth (The Garden), Taylor Eigsti (Tree Falls), Steve Gadd Band (At Blue Note Tokyo) e Mark Lettieri (Deep: The Baritone Sessions, Vol. 2).

Quem acabou perdido neste monte de categorias foi o pianista Lyle Mays, que morreu em fevereiro de 2020, aos 66 anos de idade. O disco póstumo Eberhard, com apenas uma música de 13 minutos de duração (escute nos vídeos abaixo), foi indicado como composição instrumental. A faixa é uma despedida à altura da grandeza de Mays, que tocou por décadas ao lado do guitarrista Pat Metheny.

VEJA ABAIXO TODOS OS INDICADOS NAS CATEGORIAS DO JAZZ

GRAVAÇÃO DE JAZZ

Sackodougou
Christian Scott aTunde Adjuah
Disco: The Hands Of Time (Weedie Braimah)

Kick Those Feet
Kenny Barron
Disco: Songs From My Father (Gerry Gibbs Thrasher Dream Trios)

Bigger Than Us
Jon Batiste
Disco: Soul (Original Motion Picture Soundtrack) (Various Artists)

Absence
Terence Blanchard
Disco: Absence (Terence Blanchard Featuring The E Collective And The Turtle Island Quartet)

Humpty Dumpty (Set 2)
Chick Corea
Disco: Akoustic Band Live (Chick Corea, John Patitucci & Dave Weckl)

DISCO CANTADO

Generations
The Baylor Project

SuperBlue
Kurt Elling & Charlie Hunter

Time Traveler
Nnenna Freelon

Flor
Gretchen Parlato

Songwrights Apothecary Lab
Esperanza Spalding

DISCO DE JAZZ

Jazz Selections: Music From And Inspired By Soul
Jon Batiste

Absence
Terence Blanchard Featuring The E Collective And The Turtle Island Quartet

Skyline
Ron Carter, Jack DeJohnette & Gonzalo Rubalcaba

Akoustic Band LIVE
Chick Corea, John Patitucci & Dave Weckl

Side-Eye NYC (V1.IV)
Pat Metheny

ÁLBUM DE ORQUESTRA

Live At Birdland!
The Count Basie Orchestra Directed By Scotty Barnhart

Dear Love
Jazzmeia Horn And Her Noble Force

For Jimmy, Wes And Oliver
Christian McBride Big Band

Swirling
Sun Ra Arkestra

Jackets XL
Yellowjackets + WDR Big Band

ÁLBUM DE JAZZ LATINO

Mirror Mirror
Eliane Elias With Chick Corea and Chucho Valdés

The South Bronx Story
Carlos Henriquez

Virtual Birdland
Arturo O'Farrill & The Afro Latin Jazz Orchestra

Transparency
Dafnis Prieto Sextet

El Arte Del Bolero
Miguel Zenón & Luis Perdomo