terça-feira, 23 de julho de 2019

Novo disco traz habitual energia do baixista Avishai Cohen

Nas últimas décadas, o jazz foi invadido por um conjunto de músicos que tem no jazz sua raiz, mas que também traz na bagagem a contemporaneidade do rock e do pop. Há diversos exemplos, mas podemos citar aqui nomes como Neil Cowley, The Bad Plus, Jamie Cullum, GoGo Penguin, Mathias Eick, Mammal Hands, Marcin Wasilewski, Tord Gustavsen, Avishai Cohen e o saudoso Esbjörn Svensson.

Quem já teve a oportunidade de vê-los ao vivo sabe da vitalidade de suas apresentações. A sensação é estar em uma montanha russa. O som oscila com frequência e cria uma atmosfera de grande impacto para quem está na plateia.

Entre os músicos citados, o baixista israelense Avishai Cohen tem uma das histórias mais marcantes. No meio da década de 1990, ele foi convidado pelo pianista Chick Corea a fazer parte de sua banda. De lá para cá, foram centenas de apresentações e mais de uma de dezena de discos solos lançados. Em todos eles, o baixo acústico de Cohen traz o som marcante de suas influências orientais (música árabe e israelense) e do fusion jazz (Jaco Pastorius), além de sua formação ouvindo compositores clássicos.

Em seu novo disco, Arvoles, todos os elementos que fizeram Cohen chamar a atenção do público entre centenas de talentosos músicos que circulam por aí estão presentes. O piano marcado, o baixo pulsante e a bateria seca hipnotizam o ouvinte. Ao seu lado, Cohen tem Noam David (bateria) e Elchin Shirinov (piano). Em cinco das dez faixas, o trio ganha o reforço de Bjorn Samuelsson (trombone) e Anders Hagberg (flauta).

O disco abre com o quinteto interpretando "Simonero", com o piano roubando a cena . Depois vem a singela, "Arvoles", na versão trio, na qual a vassourinha da bateria oferece o clima ideal para as belas frases que saem da cordas do baixo de Cohen. O trio volta a atacar em "Face Me", desta vez com Cohen usando o arco em seu baixo e o piano o acompanhando nota a nota.


Cohen toca durante a gravação do disco Arvoles

O tema "Gesture" tem duas partes. A primeira mais tranquila e sensível, e a segunda mais encorpada, com o piano fazendo o papel de protagonista. Nas músicas, "Elchinov" e "Nostalgia", novamente em trio, as marcas registradas de Cohen, citadas acima, como o piano marcante e o baixo pulsante, estão em sua forma mais explícita. A tal sensação de montanha russa faz o ouvinte se segurar na cadeira ao ouvir esses dois temas.

Em "New York 90s", pela primeira e única vez no álbum, o trombone solo, mas sem grande euforia. O disco fecha com a bela "Wings", sem dúvida, a música mais jazzista de todas, no formato de quinteto, com a flauta e o trombone oferecendo uma atmosfera orquestral pontual para as deliciosas picardias de Cohen e Shirinov.





sexta-feira, 19 de julho de 2019

Série Jazz Icons

A série de DVD Jazz Icons foi lançada em 2006 e foi recebida com empolgação pelos fãs de jazz. Desde então, cinco lotes de DVDs - a série foi encerrada em 2011 - foram lançados contendo shows gravados na Europa, entre 1957 e 1978, com quase todos os grandes ícones da história do jazz, entre eles, Ella Fitzgerald, John Coltrane, Louis Armstrong, Quincy Jones, Sonny Rollins, Count Basie, Art Blakey e Dizzy Gillespie.

Ao todo, a série lançou 36 DVDs e se tornou o maior acervo da história do jazz oferecido para o grande público. Seu valor é inestimável. A qualidade das gravações, o repertório, os músicos e, talvez o mais importante, o período dessas gravações. A maior parte delas foi filmada entre 1957 e 1966, considerado pelos estudiosos como um dos períodos mais importantes da história do jazz.

Entre 1957 e 1966, discos essências foram lançados, entre eles, Miles Davis (Kind of Blue), Dave Brubeck (Time Out), Charles Mingus (Mingus Ah Um), Ornette Coleman (The Shape of Jazz to Come), Sonny Rollins (Saxophone Colossus), John Coltrane (A Love Supreme), Count Basie (The Atomic Mr. Basie), Horace Silver (Song for My Father), Art Blakey And The Jazz Messengers (Moanin’), Eric Dolphy (Out to Lunch), Wayne Shorter (Speak No Evil) e Lee Morgan (The Sidewinder).

Diante dessa enxurrada de discos, o jazz vivia realmente uma época riquíssima, comparada apenas aos anos dourados das big bands, entre as décadas de 1930 e 1940. Os vídeos da coleção deixam isso bem claro. Assistir a John Coltrane (foto acima) tocando pela primeira vez em público "A Love Supreme" é uma experiência inesquecível. A gravação foi feita no festival Antibes Jazz, na França, em julho de 1965, ao lado de McCoy Tyner (piano), Jimmy Garrison (baixo) e Elvin Jones (bateria).


Lee Morgan (trompete), Jymie Merritt (baixo) e Ar Blakey (bateria)


Outro destaque é a orquestra comandada por Quincy Jones, gravada em 1960, na qual faziam parte nomes como Phil Woods (sax), Clark Terry (trompete) e Sahib Shihab (sax). Como não se arrepiar ao ver Art Blakey (bateria) e seus Jazz Messengers, em 1958, com Lee Morgan (trompete), Benny Golson (sax), Bobby Timmons (piano) e Jymie Merritt (baixo)? Blakey também aparece em um concerto no qual Wayne Shorter (sax) e Walter Davis Jr.(piano) são apresentados como os novos membros dos Jazz Messengers.

Infelizmente, a série tem poucos registros de vozes, sejam elas masculinas ou femininas. Entre os shows com vocal, destaque para a jovem Ella Fitzgerald, em show gravado na Bélgica, em 1957, com Ray Brown (baixo), Oscar Peterson (piano) e Herb Ellis (guitarra), em 1963, na Suécia, ao lado do pianista Tommy Flanagan.

Outro registro importante é de Sarah Vaughan (foto), gravados em 1958 e 1964. A Divina Vaughan traz um repertório com clássicos como "Over the Rainbow", "Lover Man" e "The More I See You". Por último, o registro de Louis Armstrong e seus All-Stars, na Bélgica, em 1959. É um dos poucos shows completos do trompetista que se tem acesso. Um verdadeiro tesouro para os apreciadores do jazz.


As grandes ausências da coleção são Miles Davis, Charlie Parker e Billie Holiday. No caso de Davis, a opção é procurar o vídeo gravado em Milão, na Itália, em 1964. A qualidade das imagens não é tão boa como da série Jazz Icons, mas é interessante ver Davis ao lado dos jovens Wayne Shorter e Herbie Hancock (piano). Sobre Parker, infelizmente, não há nenhum registro conhecido de um concerto do saxofonista, que morreu em maio de 1955, aos 34 anos de idade.

O mesmo acontece com Billie Holiday, que morreu aos 54 anos, em 1959. O melhor registro que você pode encontrar de Billie está no DVD The Sound of Jazz, que traz a íntegra do programa de TV produzido em 1957 pela CBS. Billie canta o tema "Fine and Mellow". A cantora também pode ser assistida no filme New Orleans (1947), no qual divide a cena ao lado de Louis Armstrong.


Primeira caixa lançada da série Jazz Icons. Coleção conta com 36 DVDs


Todos os DVDs, que são vendidos em cinco caixas separadas ou cada um dos 36 títulos separadamente, têm um encarte com muita informação e fotos raras. Abaixo está a relação de todos os títulos da série Jazz icons, separados em caixas. Para saber mais detalhes sobre a coleção, visite o site oficial aqui.

BOX 1

Art Blakey & The Jazz Messengers • Live in '58
Dizzy Gillespie • Live in '58 & '70
Louis Armstrong • Live in '59
Quincy Jones • Live in '60
Thelonious Monk • Live in '66
Buddy Rich • Live in '78
Ella Fitzgerald • Live in '57 & '63
Count Basie • Live in '62
Chet Baker • Live in '64 & '79

BOX 2

John Coltrane • Live in '60, '61 & '65
Dave Brubeck • Live in '64 & '66
Duke Ellington • Live in '58
Sarah Vaughan • Live in '58 & '64
Dexter Gordon • Live in '63 &'64
Wes Montgomery • Live in '65
Charles Mingus • Live in '64

BOX 3

Sonny Rollins • Live in '65 & '68
Cannonball Adderley • Live in '63
Bill Evans • Live '64-'75
Rahsaan Roland Kirk • Live in '63 & '67
Lionel Hampton • Live in '58
Oscar Peterson • Live in '63, '64 & '65
Nina Simone • Live in '65 & '68

BOX 4

Jimmy Smith • Live in '69
Coleman Hawkins • Live in '62 & '64
Art Farmer • Live in '64
Erroll Garner • Live in '63 & '64
Woody Herman • Live in '64
Art Blakey • Live in '65
Anita O'Day • Live in '63 & '70

BOX 5

John Coltrane • Live In France 1965
Art Blakey's Jazz Messengers •Live In France 1959
Thelonious Monk •Live In France 1969
Johnny Griffin •Live In France 1971
Freddie Hubbard •Live In France 1973
Rahsaan Roland Kirk •Live In France 1972















quinta-feira, 11 de julho de 2019

5 décadas de ECM

E lá se vão cinco décadas desde que o músico e produtor alemão Manfred Eicher (foto) criou a gravadora ECM (Edition of Contemporary Music), em Munique, na Alemanha, em 1969. Para quem está mais familiarizado com a gravadora, sabe que a principal preocupação de Eicher é com a qualidade de som e a experiência que esse som cristalino e impecável deve causar no ouvinte.

Aliado a essa obsessão, o selo alemão também se notabilizou por gravar músicos de diferentes partes do mundo, sem nunca se preocupar em "vender discos".

Eicher é, acima de tudo, um apaixonado pela música e usa sua criação para poder expandir as mentes das pessoas e mostrar que há musicalidade em todos os cantos deste planeta. Com isso em mente, a ECM se tornou a casa de músicos de diferentes nacionalidades, entre eles, Jan Garbarek (Noruega), Tomasz Stanko (Polônia), Palle Danielsson (Suécia), Enrico Rava (Itália), Egberto Gismonti (Brasil), Dino Saluzzi (Argentina), Lakshminarayana Shankar (Índia), Miroslav Vitous (Iugoslávia), Stephan Micus (Alemanha), Arvo Pärt (Estônia), Anouar Brahem (Tunísia) e Manu Katché (França).

A ECM também é o lar de grandes nomes do jazz como os pianistas Keith Jarrett, Chick Corea, Vijay Iyer e Paul Bley, os guitarristas Pat Metheny, John Abercrombie, Ralph Towner, Terje Rypdal, Steve Tibbetts e Bill Frisell, os bateristas Paul Motian e Jack DeJohnette, o vibrafonista Gary Burton e o baixista Dave Holland.

Foi na ECM que o guitarrista Pat Metheny e o pianista Keith Jarrett chamaram a atenção do público. Metheny lançou seu primeiro disco (Bright Size Life) na ECM, aos 21 anos de idade, e continuou gravando pelo selo alemão por uma década, com destaque para os discos 80/81 (1981), Offramp (1982) e First Circle (1984). Para Jarrett, a gravadora é sua casa desde 1971, quando lançou o disco Facing You.

Mas nada superaria o disco duplo The Köln Concert, de 1975. O álbum é considerado um marco na carreira do pianista e um divisor de águas na trajetória da ECM. Até hoje, as improvisações de Jarrett neste álbum é motivo de espanto e admiração de novos ouvintes ao terem contato com este registro histórico que traz o pianista em um transe absoluto, solando e suando a cada compasso. Além disso, Jarrett tem uma dezena de discos, incluindo DVDs, lançados no formato de trio ao lado do baterista Jack DeJohnette e do baixista Gary Peacock.

Com o passar dos anos, o antenado produtor Manfred Eicher manteve seus ouvidos abertos para descobrir e gravar novos talentos da música instrumental. Entre os "novatos", estão músicos como os pianistas Vijay Iyer, Craig Taborn, Tord Gustavsen e Marcin Wasilewski, o baixista Mats Eilertse, os trompetistas Mathias Eick e Avishai Cohen, o saxofonista Nicolas Masson e o guitarrista Jakob Bro. Conheça todos os artistas da gravadora clicando aqui


Gismonti grava com Charlie Haden e Jan Garbarek o disco Mágico, de 1979


O Brasil tem um representante de peso dentro da ECM: o pianista e violonista Egberto Gismonti. É claro que o talento do brasileiro na passaria desapercebido pelo produtor alemão, que o contratou em 1976, quando lançou o disco Dança das Cabeças, ao lado do percussionista pernambucano Naná Vasconcelos. A longa parceria com a ECM, que dura até hoje, rendeu outros importantes discos como Mágico (1979), ao lado do baixista Charlie Haden e do saxofonista Jan Garbarek, e Dança dos Escravos (1989), disco solo de violão.

De olho nas novas gerações, em 2017, a gravadora colocou todo o seu catálogo nas principais plataformas digital, entre elas, Apple Music, Amazon, Spotify, Deezer, Tidal e Qobuz. Na ocasião, a ECM disse que os lançamentos nos formatos CD e LP vão continuar, mas que a prioridade da gravadora é que a música seja ouvida. Diante do aumento da pirataria e de sites que não pagavam direitos autorais pela execução de suas músicas, a gravadora teve que sucumbir aos novos tempos.


Guitarrista John Abercrombie gravou vários discos pela ECM


O trabalho do visionário Manfred Eicher, hoje com 76 anos, não acabou e sua inquietação sempre estará ditando os rumos da ECM. A essência de seu pensamento continua intacta. Em uma entrevista na década de 1990, ele sintetizou bem o que move seu trabalho e sua missão.

"Para mim, não se trata do que eu gosto ou não gosto. As minhas decisões baseiam-se sobretudo naquilo que considero merecer ou não merecer ser gravado. Os meus critérios não são critérios de gosto, e não importa se gosto ou não de um disco que vou editar, mas apenas avaliar se ele deve ser gravado. Mas o gosto do público não afeta a minha decisão. Apenas a música".

Em 2011, foi lançado o DVD Sounds and Silence, que mostra os bastidores das gravações de vários músicos, entre eles, Arvo Pärt, Eleni Karaindrou, Dino Saluzzi, Anja Lechner e Anouar Brahem, e confidências sobre a relação profissional com Manfred Eicher. Além da seleção de vídeos abaixo, clicando aqui, você encontra uma playlist publicada pelo canal oficial da ECM no Youtube com dezenas de vídeos.