segunda-feira, 30 de dezembro de 2019

E lá se vai 2019

Impossível fazer uma retrospectiva sobre música, sem falar na morte de João Gilberto (foto), aos 88 anos, em 6 de julho. Considerado o pai da bossa nova, Gilberto levava uma vida reclusa no bairro do Leblon, na cidade do Rio de Janeiro.

Nos últimos anos, infelizmente, as notícias que chegavam sobre o cantor era sobre a disputa judicial entre seus filhos (Bebel e Marcelo) e sua ex-companheira (Maria do Céu).


Mas o legado do compositor de clássicos como "Bim Bom" e interpretações definitivas de temas compostos por Tom Jobim, entre eles, "Chega de Saudade", "Desafinado", "Garota de Ipanema" e "Só Danço Samba", está garantido para as novas gerações. Apesar da eterna briga judicial com a gravadora EMI, que impede o relançamento de seus primeiros discos, o mercado está cheio de bons registros do cantor, que nas últimas décadas não lançou novos álbuns. A importância de João foi ainda mais marcante com sua parceira ao lado do saxofonista Stan Getz, no premiado disco Getz/Gilberto, de 1964, que abriu o mercado norte-americano para a bossa nova.

Outra perda importante foi do compositor e pianista francês Michel Legrand, que morreu em janeiro, aos 86 anos. Conhecido por suas trilhas sonoras, entre elas, Summer of ’42 (1971) e The Thomas Crown Affair (1968), Legrand também tocou com grandes nomes do jazz como Miles Davis, John Coltrane, Bill Evans e Ben Webster. O jazz também ficou de luto com as mortes do vibrafonista Dave Samuels e do pianista Harold Mabern.

No cenário do jazz, o ano trouxe bons discos e o retorno de dois gigantes: os pianistas Abdullah Ibrahuim, com The Balance, e Ahmad Jamal, com Ballades. Destaque também para o volume 2 do disco formado pelo trio Chick Corea, Christian McBride e Brian Blade. Outro bom termômetro sobre os discos lançados em 2019 são os indicados ao Grammy 2020, divulgados em dezembro. Entre eles estão Melissa Aldana, Julian Lage, Branford Marsalis, Brad Mehldau, Joshua Redman e Chick Corea. Entre as vozes, destaques para os novos discos de Harry Connick Jr. Carmen Lundy, Catherine Russell, Tierney Sutton e Sara Gazarek.


Corea, McBride e Blade lançam a segunda parte do disco Trilogy


No mercado estrangeiro, dois brasileiros tiveram seus discos reverenciados pelas principais publicações do gênero: Eliane Elias e Antonio Adolfo. A pianista e cantora Eliane Elias está radicada nos Estados Unidos há três décadas e lançou o disco Love Stories pela gravadora Concord. Já o veterano pianista, arranjador e compositor carioca tem no currículo passagens ao lado de Elis Regina, Wilson Simonal, Leny Andrade, Carlos Lyra e Angela Ro Ro. O disco em questão, Samba Jazz Aley, é uma homenagem ao Beco das Garrafas, local icônico em Copacabana, na cidade do Rio de Janeiro, conhecido como o berço da bossa nova. No disco, o músico gravou temas de Tom Jobim, Johnny Alf, Edu Lobo, Baden Powell e João Donato.

2019 também trouxe registros inéditos de duas lendas do jazz: Miles Davis e John Coltrane. Do trompetista, foi lançado o disco Rubberband, que originalmente deveria ter sido o primeiro álbum do músico lançado pela gravadora Warner, no meio da década de 1980. De Coltrane, o tesouro foi chamado de Blue World, com gravações feitas em 1964, originalmente para a trilha sonora do filme Le Chat dans le Sac, de Gilles Groulx. Mas apenas 10 minutos foram usados no longa e agora, meio século depois, os fãs têm a oportunidade de ouvir Coltrane acompanhado por McCoy Tyner (piano), Jimmy Garrison (baixo) e Elvin Jones (bateria).

O ano marcou também os 50 anos da gravadoras alemã ECM, criada pelo produtor Manfred Eicher e lar de grandes nomes do jazz como Pat Metheny, Keith Jarrett, Egberto Gismonti e John Abercrombie. Quem também chegou a meio século em 2019 foi o festival de jazz de Nova Orleans, um dos mais ecléticos e democráticos festivais dos Estados Unidos. O ano também foi especialmente importante para o veterano saxofonista Wayne Shorter, que levou o Grammy de melhor disco instrumental com Emanon. Shorter também conquistou os prêmios de compositor, grupo e artista do ano na premiação anual do Jazz Journalists Association.

Para 2020, já estão confirmados os shows de Pat Metheny, Nnnenna Freelon, Lizz Wright e Take 6, todos beneficentes em prol da TUCCA (Associação para Crianças e Adolescentes com Câncer). Os shows acontecerão na Sala São Paulo, na capital paulista.

Isso sem falar nas novas edições do festivais SESC Jazz, Rio Montreux Jazz, MIMO e Amazonas Jazz. Não podemos esquecer da programação das casas Jazz Nos Fundos, Blue Note e Bourbon Street Club, todas na capital paulista.

No cenário internacional, 2020 será marcado pelo centenário do pianista Dave Brubeck e do saxofonista Charlie Parker. A capa da edição de janeiro de 2020 da revista Downbeat (foto) traz, além de Parker e Brubeck, o baterista Art Blakey, que completou 100 anos em 11 de outubro de 2019.


A importância desses músicos será ovacionada por todo ano por meio de shows, discos e muito mais. O primeiro deles foi lançado ainda em 2019. O disco Bird at 100, da gravadora Smoke Sessions, traz os saxofonistas Vicente Herring, Bobby Watson e Gary Bartz tocando temas da carreira de Charlie Parker. Eles são acompanhados por David Kikoski (piano), Yasushi Nakamura (baixo) e Carl Allen (bateria).

O ano de 2020 também vai celebrar o centenário do trompetista Clark Terry, da pianista Marion McPartland, do percussionista Tito Puente, do multi-instrumentista Yusef Lateef, do saxofonista Paul Gonsalves, do baterista Shelly Manne, do acordeonista Art Van Damme e da cantora Peggy Lee.







quarta-feira, 11 de dezembro de 2019

Count Basic - Live

Por 14 anos o Guia de Jazz esteve no ar com a missão de aproximar os internautas ao jazz. Um dos tópicos mais visitados era o de dicas de CDs, no qual dezenas de discos eram indicados e resenhados por mim.

Infelizmente, com o fim do site em setembro de 2015, todo esse acervo foi "perdido". Mas não totalmente perdido.

Além do livro Jazz ao Seu Alcance, que traz todo o conteúdo do guia, com dicas de CDs, DVDs, livros, entrevistas e muito mais, você encontrará quinzenalmente neste blog algumas dicas de CDs publicadas anteriormente no site Guia de Jazz.

Sempre que possível, ao final de cada resenha você encontrará vídeos do Youtube com algumas faixas do disco indicado para escutar. Boa leitura e audição. Veja outras dicas de CDs aqui

Count Basic - Live (1997)


Nos anos 90, o cenário do jazz ganhou duas novas vertentes, a primeira, o smooth jazz, que traz um som mais pop, e a segunda, o acid jazz, que tem nos samples e nos metais a base de seu ritmo. Essas duas novas maneiras de tocar jazz só ajudaram o gênero a se atualizar e a trazer um novo público. Uma das bandas que mais se destacou neste novo cenário foi o Count Basic, um conjunto liderado pelo guitarrista austríaco Peter Legat e pela cantora norte-americana Keli Sae. Seu som pode ser comparado aos grupos ingleses Brand New Heavies e Incognito. Um bom início para conhecê-la é o disco gravado ao vivo em Viena, Count Basic Live.

Neste quarto CD, é possível ouvir toda a energia da banda de Peter Legat, o compositor das músicas e a base de todas as canções com sua guitarra wah-wah no habitat predileto do grupo, o palco. O disco é uma coletânea com músicas de vários álbuns lançados pelo grupo. O CD abre com a contagiante “Is It Real”. Logo depois, a instrumental “Sweet Luis” traz a sutileza de Legat na guitarra. Seu toque é uma mistura de George Benson com Lee Ritenour. Como todas as bandas, o Count Basic também tem o seu hit, “Joy and Pain”, uma levada com muito suingue e a voz afinada de Keli Sae. Outra grande canção é “Movin’ In the Right Direction”, nome de um dos discos da banda.

Em “Happy”, a cantora Sae aproveita o momento para apresentar a banda ao público, entre eles estão o baterista Dirk Erchinger, o trompetista Bumi Fian e o percussionista brasileiro Laurinho Bandeira. A banda brilha pra valer na faixa instrumental “Animal Print”, com destaque para o trombone de Christian Radovan e o baixo de Willi Langer. Kelli Sae ainda é destaque em “Got To Do” e “Jazz In the House”. É impossível não salientar a firmeza e o talento de Peter Legat e sua guitarra. Como um maestro, ele dá um show na singela melodia de “M.L. In the Sunshine”. É de arrasar.

Count Basic normalmente não agrada aos fãs tradicionais de jazz que têm um certo preconceito com o smooth jazz e o acid jazz. Mas não se deve simplesmente rotular este ou aquele som de bom ou ruim. É preciso, acima de tudo, ouvir a competência musical e a criatividade dos músicos. Neste quesito, e sem uma visão saudosista dos antigos mestres do jazz, Count Basic vai agradar a qualquer pessoa que tem como principal filosofia ouvir boa música.

terça-feira, 3 de dezembro de 2019

Concursos descobrem novos talentos do jazz

Que os Estados Unidos é uma fonte inesgotável de músicos de jazz, isso ninguém duvida. A arte do jazz está espalhada em várias partes do mundo, mas é inegável que a terra do Tio Sam reúne a maior quantidade de jazzistas por metro quadrado do planeta.

Não é à toa que o país concentra grandes festivais de jazz, as mais importantes gravadoras, publicações especializadas, escolas de música renomadas (Juilliard e Berkleee) e clubes de jazz icônicos (Birdland e Village Vanguard).

Para manter seu celeiro de talentos sempre renovado, os Estados Unidos contam com dois concursos que se tornaram referência no país: Sarah Vaughan International Jazz Vocal Competition e Thelonious Monk Institute of Jazz International. A partir de 2018, a competição com o nome de Monk ganhou o nome de Hancock Competition, produzido pelo Herbie Hancock Institute of Jazz.

O concurso que traz o nome da cantora Sarah Vaughan foi criado em 2012 e é exclusivamente voltado para novas cantoras. Em suas oito edições, a competição teve entre suas vencedoras nomes como Cyrille Aimée, Jazzmeia Horn e Quiana Lynell. Em 2019, a vencedora foi Samara McLendon (foto acima), que nasceu no Bronx, em Nova York. Nesta última edição, entre os jurados estavam as cantoras Dee Dee Bridgewater e Jane Monheit e o baixista Christian McBride.

Na competição que agora leva o nome do pianista Herbie Hancock, a cada ano, um instrumento é destacado. Em 2018, por exemplo, o concurso foi exclusivamente entre pianistas. O vencedor foi o israelense Tom Oren.

A última edição que trouxe cantoras na disputa aconteceu em 2015, vencida por Jazzmeia Horn (foto) venceu. Em 2019, o instrumento escolhido foi a guitarra. O vencedor foi o russo Evgeny Pobozhiy.

Criado em 1987, o concurso já revelou nomes como Marcus Roberts (piano), Joshua Redman (sax), Chris Potter (sax), Jacky Terrasson (piano), Jane Monheit (cantora), Gretchen Parlato (cantora), Ambrose Akinmusire (trompete), Cécile McLorin Salvant (cantora) e Melissa Aldana (sax). No júri, feras como Herbie Hancock, Jason Moran, Patti Austin, Quincy Jones, Wayne Shorter e Ron Carter.

Veja todas as ganhadoras do Sarah Vaughan International Jazz Vocal Competition:


Cyrille Aimée
Jazzmeia Horn
Ashleigh Smith
Arianna Neikrug
Deelee Dubé
Quiana Lynell
Laurin Talese
Samara McLendon


Abaixo você vê uma entrevista com a cantora Samara McLendon, um dia após vencer o concurso, em novembro de 2019. Veja ainda o quarteto do saxofonista Eli Degibri, com a participação do pianista israelense Tom Oren, vencedor em 2018 do Hancock Competition, o guitarrista russo Evgeny Pobozhiy, vencedor em 2019 do Hancock Competition, e vídeos das cantoras Laurin Talese, Quiana Lynell, Deelee Dubé e Jazzmeia Horn.