sexta-feira, 12 de abril de 2019

Herbie Hancock, o camaleão do jazz

Quem diria que aquele menino franzino, nascido em Chicago, Illinois (EUA), em 1940, se tornaria um dos mais influentes e talentosos jazzistas do século XX.

Herbie Hanconk, nascido em 12 de abril, lançou seu primeiro disco há 57 anos, quando tinha 22 anos de idade.

Takin' Off (62) trazia o jovem pianista acompanhado por Freddie Hubbard (trompete), Dexter Gordon (sax), Butch Warren (baixo) e Billy Higgins (bateria). No repertório estava a música que marcaria para sempre sua carreira, "Watermelon Man".

O disco foi o cartão de visita que levaria Hancock a ser convidado por Miles Davis para fazer parte de seu novo quinteto, Além de Hancock, o grupo tinha Wayne Shorter (sax), Ron Carter (baixo) e Tony Williams (bateria). Hancock tocou com Miles entre 64 e 68. Entre os disco lançados neste período estão E.S.P., Miles Smiles, Sorcerer, Nefertiti e Miles in the Sky.

Outro álbum desta época é Live At The Plugged Nickel (1965), registro de duas noites do quinteto na casa Plugged Nickel, em Chicago. Em 1995, uma caixa com oito CDs foi lançada com as duas apresentações na íntegra.

Depois de deixar Miles, Hancock começou a mergulhar no universo do jazz fusion e do jazz funk, mistura de rock e funk com o jazz. Nesta época, lançou um novo grupo, The Headhunters.

O disco de estreia, de 1973, traz o tema "Chameleon", que se torna um dos maiores êxitos de toda carreira do pianista. É um dos disco de jazz mais vendidos de toda a história, ao lado de Kind of Blue (Miles Davis), Time Out (Dave Brubeck) e Breezin (George Benson).

Durante toda a década de 1970, Hancock manteve essa pegada funk, tocando piano e o órgão Fender Rhodes.

No fim desta década, Hancock criou o supergrupo V.S.O.P. (foto ao lado), que tinha a mesma formação do quinteto de Miles (Hancock, Wiliams, Shorter e Carter), mas com o trompetista Freddie Hubbard tocando trompete "no lugar" de Miles.

O grupo traz o jazz tradicional, mas com uma pitada mais moderna. Hancock também foi responsável pela ascensão dos irmãos Wynton e Branford Marsalis, ambos com 21 e 22 anos, respectivamente. A duplo entrou no lugar de Hubbard.


Hancock na década de 1970 com seus sintetizadores

A década de 1980 foi decisiva para Hancock se tornar um músico universal. Sua incursão ao hip hip, no disco Futero Shock (1983), com o hit "Rockit" trazia o músico comandando sintetizadores, que na época eram uma novidade. O impacto da músico cresceu com a produção de um vídeo clipe inovador, que ficou com cinco prêmios no MTV Video Music Awards, em 1984. O disco também deu a Hancock o primeiro Grammy de sua carreira.

Ouça no player a seguir o podcast Jazzy especial sobre o pianista:


Em 1987, Hancock ficou com o Oscar de melhor trilha sonora pelo filme Por Volta da Meia-Noite, estrelado pelo saxofonista Dexter Gordon. Na década de 1990, Hancock voltou a tocar o jazz tradicional. O resultado foram belos discos, como A Tribute to Miles Davis (1992), The New Standard (1996), 1 & 1 (com Wayne Shorter) (1997) e Gershwin's World (1998), e mais quatro Grammy para a sua coleção de 14 Grammys.

Ainda durante os anos 90, Hancock alcançou as paradas com a música "Cantaloop (Flip Fantasia)", lançada pelo grupo britânico US3. O tema original foi composto por Hancock, em 1964, e lançado no disco Empyrean Isles. O US3 usou a base da música do pianista para fazer uma mistura deliciosa entre jazz, funk e hip hop. O disco Hand On the Torch, do US3, é considerado o ponta pé inicial do movimento acid jazz, que marcou a década de 1990.

Nos últimos anos, Hancock tem mantido sua rotina de shows nos principais festivais de jazz nos Estados Unidos e na Europa. Também investiu em álbuns mais populares, com a participação de artistas ligados ao mundo do rock e do pop.

É o caso dos discos Possibilities (Christina Aguilera, John Mayer e Sting) (2005), River: The Joni Letters (Norah Jones, TIna Turner, Luciana Souza) (2007) e The Imagine Project (Pink, Ceu, Juanes, Dave Matthews) (2010).

O disco em tributo a cantora Joni Mitchell (foto acima) ficou com os prêmios Grammy de melhor disco de jazz contemporâneo e o principal prêmio de todos, o de disco do ano, em 2007.

Em 2013, o pianista foi homenageado com o prêmio Kennedy Center Honors, uma honraria oferecida pelo governo dos Estados Unidos a artistas (músicos, cineastas, bailarinos etc) com uma trajetória artística relevante para a sociedade. Antes de Hancock, músicos como Dave Brubeck, Ella Fitzgerald, Frank Sinatra e Dizzy Gillespie também foram agraciados com o mesmo prêmio.

Atualmente, Hancock é embaixador da boa vontade da UNESCO e o principal idealizador do Dia Internacional do Jazz, que é comemorado anualmente, desde 2013, no dia 30 de abril.

Em 2019, a cidade escolhida para ser sede do evento é Melbourne, na Austrália. Entre os músicos convidados estão Dee Dee Brigewater, Kurt Elling, Eijiro Nakagawa, Antonio Sánchez e o violonista brasileiro Chico Pinheiro.









terça-feira, 2 de abril de 2019

Branford e Joshua voltam ao formato de quarteto

Eles foram considerados prodígios quando apareceram no fim da década de 1980 e no início da década de 1990. O instrumento escolhido por ambos, coincidentemente, foi o saxofone.

Seus sobrenomes não foram decisivos para suas carreiras, mas ainda hoje carregam em seus DNAs este legado, algo que sempre se orgulharam, mas nunca ofuscaram o talento que exibem há mais de duas décadas.

Branford Marsalis e Joshua Redman têm trajetórias bem distintas quando se trata da estrada que cada um resolveu trilhar, mas a herança musical é inegável em suas carreiras. Redman é filho do saxofonista Dewey Redman (1931-2006) e Marsalis é o filho mais velho do pianista Ellis Marsalis (1934) e irmão do trompetista Wynton Marsalis.

No decorrer das décadas, os dois se mostraram inquietos e muito criativos. E agora, que ambos passaram dos 50 (Redman completou em fevereiro e Marsalis tem 58), isso se mantém e pode ser comprovado em seus novos discos, ambos no formato de quarteto (sax-piano-baixo-bateria): The Secret Between the Shadow and the Soul (Marsalis) e Come What May (Redman).

Após 20 anos sem gravarem juntos - os discos anteriores são Beyond (2000) Passage of Time (2001) -, Redman reuniu seu quarteto, formado por Aaron Goldberg (piano), Reuben Rogers (baixo) e Gregory Hutchinson (bateria), e fez mais um belo disco autoral, com temas que são facilmente assimilados pelo ouvinte.

As delicadas "Vast" e a faíxa-título são melodias que parecem se moldar ao ambiente onde são executadas. Em "I'll Go Mine", a bateria sincopada dá o ritmo para os solos rápidos e elegantes de Redman.

A conversa franca entre Redman e Goldberg aparece com força em "Sagger Bear" e "Circle Of Life". Mesmo sem gravarem com frequência, Goldberg é sempre escalado por Redman para acompanhá-lo em suas turnês, criando assim uma afinidade musical que só as convivência pode proporcionar.

A relação de Marsalis com seu quarteto é muito similar a de Redman. O pianista Joey Calderazzo e o baixista Eric Revis acompanham o saxofonista há duas décadas. O novato, o baterista Justin Faulkner, desde 2009. O quarteto tem um som conciso e muito bem executado. As viagens musicais de Marsalis são bem menos palatáveis aos ouvidos de ouvinte não iniciado em comparação a Redman.


Gregory Hutchinson, Aaron Goldberg, Joshua Redman e Ruben Rogers

Logo de saída, "Dance of the Evil Toys", composta por Revis, é uma porrada de quase nove minutos que deixa claro a inquietação do quarteto. Depois aparece a delicada melodia "Conversation Among the Ruins", de Calderazzo, com Marsalis fazendo papel de coadjuvante.

O pianista também é responsável pelo tema "Cianna", com Calderazzo e Marsalis em perfeita sintonia. Em "Snake Hip Waltz", composta pelo pianista Andrew Hill, o quarteto mostra como deve ser a "conversa" entre quatro músicos de jazz. Seus instrumentos se completam, criando um belo arranjo para a obra do inquieto Hill.


Branford Marsalis, Justin Faulkner, Eric Revis e Joey Calderazzo

O disco fecha com "The Windup", de keith Jarrett. Mais uma vez, o jazz pesado toma conta do ambiente e espalha por todos os cantos as frases nervosas que saem do saxofone de Marsalis. Destaque também para a bateria de Faulkner, que parece um trem desgovernado, mas conduzido com maestria pelo maquinista Faulkner.

Outro disco de quarteto, também com saxofone, que merece ser escutado é Everybody Gets the Blues, do pianista Eric Reed, lançado pelo selo Smoke Sessions. Ao lado de Tim Green (sax), McClenty Hunter (bateria) e Mike Gurrola (baixo), Reed traz versões de temas compostos por Cedar Walton, Stevie Wonder, The Beatles, John Coltrane e Freddie Hubbard, tudo com uma pitada de gospel e blues.

Ouça:
"Snake Hip Waltz" e "Cianna", de Marsalis
"How We Do" e "Circle of Life", de Redman:








sexta-feira, 29 de março de 2019

Toca Raul de Souza

Seis décadas de carreira, 84 anos de idade, criador do instrumento Souzabone (trombone em dó com quatro pistões), parceiro dos principais instrumentistas do Brasil, reconhecido mundialmente e aclamado como o maior trombonista do planeta.

A ficha corrida de João José Pereira de Souza, mais conhecido como Raul de Souza, ainda inclui parcerias com Freddie Hubbard, George Duke, Sarah Vaughan, Sonny Rollins, Cal Tjader, Freddie Hubbard e Kenny Clarke.

Raul tem uma sonoridade muito particular, que mistura samba, gafieira, funk e jazz. O som de seu instrumento, um trombone meio baixo, mais usado em orquestras, é referência em diversas partes do mundo. A prova disso é a inclusão do disco Colours, de 1975, como material didático na conceituada escola de música Berklee College, de Boston, nos Estados Unidos.

Na cronologia de sua carreira também constam trabalhos com Pixinguinha e Agostinho dos Santos, além de participar do que ficou conhecido como o primeiro disco de música instrumental brasileira, em 1955, ao lado do acordeonista Sivuca, do violonista Baden Powell e do flautista Altamiro Carrilho.

A carreira internacional do trombonista começou em 1964, época em que tocava na banda de Sergio Mendes. Raul participou do antológico disco de Mendes chamado Sergio Mendes & Bossa Rio - Você Ainda Não Ouviu Nada. Na ocasião, Mendes era o músico brasileiro com mais visibilidade nos Estados Unidos.

O talento de Souza não passou desapercebido. Logo em seguida, foi convidado para excursionar no exterior com a cantora Flora Purim e o percussionista Airto Moreira. Depois, mergulhou no universo do jazz funk - época na qual reinou a gravadora CTI - ao lado do produtor e pianista norte-americano George Duke. O resultado foi o disco Sweet Lucy (foto acima) , de 1977.

Diante da repercussão de seus discos e apresentações no exterior, Raul passou os últimos 40 anos morando longe do Brasil, mais especificamente nos Estados Unidos (Los Angeles) e depois na França (Paris).

Felizmente, Raul continuou se apresentado no Brasil e gravando com músicos de várias gerações, como o gaitista Gabriel Grossi, João Donato (foto ao lado) e Robertinho Silva.

Com Grossi, lançou o disco Brazilian Samba Jazz, de 2015, e com Donato e Silva o álbum Bossa Eterna, de 2008, quando foi festejado os 50 anos do nascimento da Bossa Nova.

O último álbum, Blue Voyage, foi gravado na França. Ao lado de Raul estão Glauco Solter (baixo), Mauro Martins (bateria), Leo Montana (piano), Alex Correa (piano).

Outro registro que merece ser procurado é a caixa O Universo Musical de Raul de Souza , de 2012, que inclui o CD Voilà e um DVD com um show gravado no Sesc Vila Mariana, em 2001, com Raul acompanhado por Fabio Torres (piano), Mário Conde (guitarra e cavaquinho), Glauco Solter (baixo) e Serginho Machado (bateria), além das participações especiais de Hector Costita, João Donato e Altamiro Carrilho.